terça-feira, 1 de dezembro de 2009

SOLIDÃO

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Caminhar em comum incomodava-o, nem ele sabia bem porquê, e, lentamente, foi procurando o refúgio das veredas. Mas até estas, às tantas, lhe pareciam movimentadas auto-estradas.
Começou a traçar mapas do seu percurso, rumos inventados que apenas existiam dentro de si. No princípio gozou a liberdade, o prazer de percorrer uma estrada incólume, original, em que apenas prestava contas a si próprio. Navegava com a lua, viajava com o vento que embalava os pinhais, fez-se regato a observar as nascentes...
Um dia quis partilhar o seu mundo. Olhou em volta, mas tinha sido eficaz na escolha do caminho: não havia ninguém por perto. Então, a pouco e pouco, uma sensação de frio começou a apoderar-se da sua alma, tolhendo-lhe qualquer espécie de harmonia com o cenário inventado. Ainda esbracejou, mas tinha viajado para muito, muito longe, e apenas encontrou o aperto do vazio.
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8 comentários:

  1. A sua prosa estremece-se sempre.Deveria pensar em publicar contos ou uma novela ou romance.Eu sei que não é fácil, porque as editoras «cortam-se», mas eu arriscaria.
    Já se lembrou de ir publicando, às vezes, no seu livro virtual, capítulos de um livro?
    Eu já dei comigo a pensar nisso e a intercalar também uma novela com outro tipo de textos, mas isso exige um público assíduo. Difícil é arranjar tempo para o fazer.Sei bem disso.
    Este percurso de solidão foi arriscado,mas resultou literariamente.Se resultou!

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  2. Numa possível paisagem, pintaria o teu poema só com duas cores: preto e branco.
    :)
    Ao longo desta caminhada,lado a lado com as tuas palavras, por estradas e atalhos, olhei em redor e... vou dizer-te o que vi:
    - caminhadas de solidão que deixam rastos intemporais... (por vezes, o luar atento até permite que se sigam, mas o vento revolto depressa as tenta apagar);
    - a ilusão de seguir em frente... (por vezes menos dolorosa que a realidade de voltar atrás e, nessa angústia, a solidão vai ganhando a viagem);
    - o aperto desse vazio, o desânimo interior e a incapacidade de regressar à liberdade sensacionalmente poética (mesmo num texto em prosa);
    - o sufoco da razão... (e ainda não sei, se por momentos, dei a mão ao teu caminhante ou à solidão).
    Ainda bem que a viagem terminou...
    Profunda caminhada, Agostinho!

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  3. Devo rectificar: onde se lê "poema", deve ler-se "texto".
    :)

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  4. SOLIDÃO....
    abomino - te como palavra, sentimento e sensação;
    por mais que eu te odeie
    persegues-me.
    Pergunto tantas vezes,
    se há sempre tanta gente à minha volta
    porque me acompanhas?
    A revolta, a angústia, a sensação do vazio...
    não pertenço certamente a este lugar...

    .....

    Desculpe o desabafo, mas esta palavra mexe tanto comigo! Pela negativa.
    O seu jeito é sublime de transcrever os sentimentos...
    não se esqueça de continuar a escrever, porque eu, estou a aprender consigo a dar outro sentido às palavras,mas esta...a.o.

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  5. #Ibel,
    Escrever um livro nunca esteve nos meus horizontes mas, quem sabe, um dia...?
    Depois, como muito bem refere, há a questão do tempo e, por mais que tentemos contrariar essa ideia, um dia tem apenas 24 horas. E a escola ocupa-me tanto tempo!!!

    #JB,
    Como sabes, haverá muitas outras formas de interpretar este texto, mas apreciei a intensidade que puseste na tua leitura, dando-lhe uma vivacidade muito própria.

    #a.o.
    Compreendo a sua aversão pelo que a palavra sugere, pelo sofrimento que implica. Mas compreenderá que às vezes se escreve sobre um tema com diversas intenções, sendo que aqui a questão estará mais nas consequências de determinadas opções. Saliento, no entanto, que este texto - pelo menos foi essa a minha intenção - foi escrito como um ponto de partida, não de chegada.
    Volte sempre!

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  6. Agradeço as suas palavras e por isso repito,
    bem haja por me ensinar a dar um sentido diferente a determinadas palavras...nasci num país diferente e até aos 5 anos vi um mundo totalmente diferente, a partir daí a vida não tem sido fácil, mas é por isso mesmo que leio o que escreve...
    escreva o livro, de certeza que encontrará uma maneira de ter o tempo necessário "Querer é poder" e assim, quando me sentir "em baixo" vou procurar nas suas palavras um alento para continuar a minha caminhada...a.o

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  7. Quando falas da solidão sinto cá um arrepio! Olha lá, e se combinássemos antes um jantarinho? Que tal?

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  8. Agostinho, já percebeste que andei numa solitária caminhada por aqui, não é?!
    Parece quase frase encomendada, mas não é, sei precisamente do que falas...
    ... e de repente à nossa volta..., e a gente repara que..., a gente pára para reparar que...
    que aconteceu afinal?! fiz-me à estrada, mas nunca me esqueci de ninguém..., dei... dei... dei, era assim que me sentia bem, a melhor forma de receber é se dar, se doar...
    julgamos nós...
    porque, de repente..., não está lá ninguém... e a gente grita aflito... mas... ninguém que nos ouça, e à nossa volta o ruído é lixo, martela na cabeça e aqui dentro do peito... e quanto mais a gente grita mais a gente repara como o mundo está cada vez mais surdo, mais cego, mais frio mais cruel, menos mundo, menos gente, menos pessoa...
    se eu te entendo Agostinho, como se te conhecesse desde sempre.
    Te abraço, Amigo.

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