domingo, 3 de fevereiro de 2013

A MARGEM

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Fim de tarde. A margem do rio, moldada desde sempre por partidas e chegadas, enverga coçado vestido, mas a luz, única, teima em conferir-lhe um toque de dignidade. 
O movimento é forjado em pressas de pão, contas por pagar, mas também em olhares em contra mão, rabiscos poéticos alicerçados em mil e uma histórias que se confundem com o tempo. Os vendedores de miudezas e de ilusões apenas ajudam a compor a paisagem de pressas várias, pintalgada, aqui e ali, com as leves impressões digitais dos turistas.
Os golfinhos partiram há muito, mas as gaivotas, adaptadas a qualquer circunstância, teimam em descobrir o alimento que tende a tornar-se mito para outras espécies, mais imunes a viscosas realidades. 
A canoa já não sulca, mas os saudosos continuam a pintá-la nas telas, desmentidos pelo vaivém dos cacilheiros. Os rostos, espelho da agrura diária, tendem a tornar-se mais contraídos. Só a noite, liberta do afã da sobrevivência, acode ao desespero apressado da margem. É então que as ninfas ressurgem, borboletas efémeras onde despertam, a prazo, os sonhos adormecidos.
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41 comentários:

  1. Minha alma lusa, meu coração celta e meu sangue mouro, reconhecem-se neste teu texto, desta Lisboa mulata... um dia acordaremos e os serão os que nós quisermos...

    (hoje, excepcionalmente a pedido, gostaria da sua visita...)

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  2. Na efemeridade das coisas da vida, apenas a margem, a luz e a noite permanecem intocáveis... testemunhas do destino a cumprir-se.

    Laura

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  3. Enquanto as ninfas ressurgiram do Tejo não nos perderemos das raízes.

    Beijo meu

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  4. Moro bem á beira do Tejo mas, nunca tive o privilégio de me encontrar com as ninfas...
    Bjs

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  5. Apesar da melancolia das constatações no fundo de nossas almas sempre um resquício de esperança...nós brasileiros somos ssim desde sempre.
    Um abraço

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  6. Mesmo que a prazo, mas que esses sonhos sejam acordados e realizados!
    boa semana AC

    beijinho e uma flor

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  7. Poeta ,

    Sua escrita vai tocando nos limites entre as coisas .
    O lado de dentro é o externo . O lado externo é o de dentro .
    Beijos e boa semana

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  8. Olá, AC!

    É o retrato possível duma Lisboa de glórias há muito passadas: em que as gaivotas se adaptaram mais facilmente que as gentes que cruzam o rio onde já não navegam canoas - mas que nem por isso perdeu o encanto.

    Abraço amigo
    Vitor

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  9. ... também gosto muito de o ler, AC... tenho pena de ter tão pouco tempo para as leituras...

    O meu abraço!

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  10. Muito sensível sua descrição. Vai além do óbvio para atingir o mais profundo, enlaçando afetos e sonhos em uma declaração de amor à terra natal. Abraços.

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  11. As ninfas continuam por lá, a nadar no Tejo, mas por vezes parece que nos agraciam cada vez menos...
    Embora neste texto e neste este blog, deixem sempre um pouco da sua presença inspiradora!

    Boa semana, beijo

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  12. Pena que tudo esteja mudado no cenário.Mas foste brilhante, mais uma vez na escrita e inspiração. Tornas tudo lindo! beijos,chica

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  13. acordar os sonhos e niná-los em doce melodia,

    a
    braço

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  14. As vezes acho que as ninfas moram dentro de nos...

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  15. Memórias vivas de um tempo

    que se move
    Excelente

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  16. Belo texto poético Agostinho. Real e ao mesmo tempo sonhador.
    Abraço
    Caldeira

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  17. A tela da memória, só é vívida para os que se encontram à margem. Os novos, nunca reconhecerão o quem nem ouvem mais.

    Abraços poeta!

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  18. Belíssimo texto despertando memórias.Obrigada.Beijo

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  19. Olá, nobre amigo AC!
    Algures, há resquício da natureza pitoresco digno de tuas pulcras palavras e conotações. Que os alumbramentos doravante não sejam somente por meio de imagens representativas ou metafóricas.
    Aqui nos regala com mais um texto impressionante.

    Abraços do amigo de além-mar.

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  20. Meu amigo

    Como sempre um texto maravilhoso e infelizmente muito verdadeiro na sua essência.

    Um beijinho com carinho
    Sonhadora

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  21. Foste falando do que já não é. Pintaste um lindo retrato do que já foi. E feito em traços lindos e poéticos e vivos...

    Beijos, querido A.C.

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  22. Realidade adornada de lindas palavras...AC, grande abraço!

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  23. O movimento é forjado em pressas de pão, contas por pagar, mas também em olhares em contra mão, rabiscos poéticos alicerçados em mil e uma histórias que se confundem com o tempo.

    Escrita com alma e poesia.

    Lindo!

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  24. Belo texto em que não falta a força do sonho. Beijinhos

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  25. Que não nos falte força para embalar os sonhos !
    Beijinhos

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  26. Um texto excelente muito bem acompanhado pelo som.
    Um abraço e bom foim de semana

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  27. E o rio, continuará a sê-lo!
    Belo texto.
    Abraço meu

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  28. realidades cruas e um texto que me deixou comovida.

    e o rio continua a abraçar o mar.

    um bom fim de semana.

    um beijo

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  29. Quando a realidade machuca, dói ainda mais olhar para trás e ver o que foi perdido. O homem, no entanto, não perde a capacidade de sonhar e tudo pode alterar se se dispõe a fugir da inércia e começar a lutar. Bjs.

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  30. Amigo AC:
    Tudo prefeito, o texto e a melodia.
    Saltei para dentro da tua magia.

    beijinho

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  31. AC,
    Um texto belíssimo e profundo que me levou até Lisboa, cidade que amo e venero com a luz, o cheiro do rio e as gaivotas inconfundíveis.
    O som escolhido foi o casamento perfeito.
    Parabéns!
    Bj :)

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  32. Ainda bem que sempre a uma beleza no final, mesmo que seje por momentos, como a borboleta que aparece uma uma ninfa.
    beijos meu caro AC.

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  33. Muito belo, AC!

    Bom fim de semana :)
    Beijo
    Sónia

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  34. As Tágides ainda permanecem no rio, AC. Ainda são elas que guardam o sol de Lisboa e o sono das gaivotas, para inspiração do poeta. Não há sonho que não se liberte, ante a beleza do seu canto.

    Obrigada!

    Um abraço

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  35. Partir e chegar...mais alguma coisa? acredito que não.

    bjs e saudade tuas, estás bem esperamos.

    as cozinheiras

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  36. Quem ainda consegue falar de termos tão poéticos, tem a capacidade de resgatar a capacidade de sonhar. Um abraço!

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  37. Ficamos presos às margens dos rios, os nossos sonhos, esses, há muito foram levados por correntes de água tempestuosas.
    Sempre excelente.
    Beijinhos
    Maria

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  38. E não é que trouxeste Lisboa até aqui?! pelos cheiros, pela tarde, a canoa, o "fado"___ as ninfas libertam-se e eu também! E aquele homem da direita...lembra-me o 007 :)

    A margem aqui tão perto....

    Beijo de gaivota :)

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  39. Uma beleza a prosa poética que emana do texto. Uma aquarela que beira a perfeição tal a justeza das tintas, tal a justeza do ritmo que confere ao texto uma melodia de uma suavidade que seduz o leitor.
    Abraços,

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  40. Agostinhamigo

    Bom, boníssimo

    Mais um excelente trabalho. Gostei. Só a noite, liberta do afã da sobrevivência, acode ao desespero apressado da margem. É então que as ninfas ressurgem, borboletas efémeras onde despertam, a prazo, os sonhos adormecidos. é uma imagem de se lhe tirar o chapéu.

    Abç

    H

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