sexta-feira, 6 de maio de 2022

PONTES, BALOIÇANTES, ENTRE O VELHO E O NOVO

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AC, Ruínas do castelo de Castelo Novo
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Caminha-se pelas graníticas ruas de Castelo Novo, quase sem vivalma, com marcas evidentes dum passado já longínquo. Ainda assomam esboços de personagens por entre as rochas, à socapa, como que a querer-nos contar a história a seu modo, mas só os mais observadores reparam nelas. O passado entristece pelo desprezo, como que a augurar que, assim, o futuro não será nada risonho.
Nalguns quintais, em casas mais desafogadas, as laranjeiras e os limoeiros continuam a manter o porte digno. Mas também nalguns becos, com pequenas casas bem aconchegadas, se conseguem vislumbrar as vivências doutras eras. Incertas, pela certa, temperadas por uma religião, sob a égide da Ordem de Cristo, herdeira dos Templários, que apostava, acima de tudo, no simbolismo. Como dizia uma certa fadista, cantarei até que a voz me doa. Por mais que sofrida.
Em toda a área circundante da pequena aldeia - já foi concelho, note-se, daí ser obrigatório, para qualquer visitante, espreitar o Pelourinho e a antiga Casa da Câmara, ainda bem conservados - se sente o abraço aconchegante da Gardunha. As encostas já foram riqueza florestal, é verdade, mas o amarelo das giestas, nesta altura do ano, a substituir o negro dos incêndios, adorna os afloramentos graníticos duma beleza singela, combinando a rudeza da rocha com a delicadeza da flor.
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AC, Encosta da Gardunha sobranceira a Castelo Novo
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No castelo roqueiro, ou no que sobra dele, a visão panorâmica amplia-se. E por ali ficamos, contemplando, deixando aflorar uma mescla de informações que nos foram tatuando ao longo do tempo, embalados no cantar da água das duas ribeiras que circundam a povoação: a Ribeira de Gualdim (referência ao Mestre Templário Gualdim Pais, pela certa) e a Ribeira de Alpreade, onde ainda se podem observar as ruínas de várias azenhas que marcavam o quotidiano doutros tempos. E é neste enquadramento, com o tempo parado, que se recorda o essencial do foral concedido pelo rei, com as antigas lendas a ganharem alforria, dando vida a cada esquina, enquanto se vislumbram algumas casas senhoriais, amplas e desafogadas, contrastando com a necessidade do esforço hercúleo dos braços da populaça para garantirem o sustento, mais de uns do que de outros.
O sol começa a inclinar, tal como o tempo, convidando a uma visita diferente, entre quatro paredes, a fim de restaurar o corpo e a alma. E assim, ainda embalados por histórias de outros tempos, com um leve aroma de Belisandra no ar, se manipulou faca e garfo, com um sorriso de satisfação sempre presente. Estômagos refeitos e mentes claras, bem o sabemos, ajudam sempre a mitigar o caminho.
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16 comentários:

  1. Fotos e textos muito interessantes que gostei de ver e ler.
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    Feliz fim-de-semana.
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    Pensamentos e Devaneios Poéticos
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  2. Uma publicação interessante historicamente falando!
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    Cheira a verão, numa primavera apressada

    Beijos, e um bom fim de semana.

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  3. Um local que embora agreste me parece muito belo e que infelizmente não conheço.
    Abraço, saúde e bom fim de semana

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  4. Gostei imenso desta tua visita guiada e adornada pelo tua grandiosa explicação e fotografias. Não conheço mas gostaria de ver au vivo:)
    Beijos e um bom sábado

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  5. Que maneira bonita de falar do nosso Portugal, tão esquecido por muitos.
    Convém mesmo depois de um passeio destes comer um bom repasto...o que não falta por lá. Um exemplo, o arroz tostado e uns peixinhos da horta :)
    Brisas doces **

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  6. Sabe que sempre tive essa sensação de encontrar gente do passado, ao visitar algum lugar há muito abandonado? Não, não há nada de místico ou supersticioso: é que tudo o que se lê, investiga e estuda parece ganhar vida, de novo, ali, diante dos olhos. Não deixa de ser uma pequena recompensa por tanto trabalho rsrssss...
    Excelente texto, apreciei muito.

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  7. Senti o abraço da serra da Gardunha e vi o amarelo das giestas. E li o seu texto com referências histórias e um despovoamento que dói pelo abandono. É muito bom ler o que escreve.
    Muita saúde.
    Um beijo.

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  8. DEUS SALVE AS MÃES!
    Só mãe dá à luz de amor.
    Ser mãe é ser e ente
    À imagem ao Criador,
    Reproduz – semente.

    FELIZ DIA DAS MÃES! Laerte

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  9. Muito belo!
    O fascínio da História e o do tempo. E as imagens que nos restam.
    Não resisti a procurar também saber de Belisandra, da sua lenda.

    Beijos e tudo de bom!

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  10. Que belo texto colocando em contraponto a natureza e a História...sob o pano de fundo de uma, tanta vida humana ao mesmo tempo efêmera e ao mesmo tempo eterna! bom sentir a história eternizada em imagens de tanta ancestralidade. Que bom sentir fazer parte de uma realidade assim tão plena de vida que de alguma forma ainda persiste.
    Um abraço

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  11. Olá, lugares lindos e uma rica descrição dos lugares, gostei muito.
    Estou com um novo blog, uma nova proposta, te convido a conhecer e me seguir por lá, abraços! ;) https://botecodasletras2.blogspot.com/

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  12. Só a designação deixa-me com tonturas.
    Abraço, boa semana

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  13. Boa tarde AC
    Um texto que gostei de ler.
    Visitei a zona em 2019 e gostei bastante do que vi, este texto só me veio alargar a minha visão.
    Gostei bastante!
    Que a Semana seja boa e cheia de saúde.
    Um beijo
    :)

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  14. Que texto maravilhoso!...
    Nos transporta ao lugar
    Descrito e imaginar
    Um limoeiro viçoso
    E imaginar-se ao gozo
    Das laranjas de um pomar
    Do castelo secular
    Já ao desfrute da gente
    Protegida do sol quente
    À sombra e tomando um ar.

    Parabéns pelo maravilhoso texto. abraço fraterno. Laerte.

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  15. Viajando através das suas palavras, AC... que nos dão a descobrir a alma de tão belos lugares! Texto e imagens num complemento perfeito!
    Beijinhos
    Ana

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