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AC, Ninho de melro
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Viver no campo é bom, é mesmo muito bom, mas desiluda-se quem pense que tudo é descanso e contemplação. As tarefas acumulam-se, de dia para dia e, por mais que se faça, parece que pouco ou nada se fez. Há pois, que desligar da vida lá fora - o das pessoas apressadas - aprender a relativizar as coisas, dar-lhes a importância que realmente têm. Só assim se alcança a satisfação, o equilíbrio.
Andava eu, esta manhã, a tentar domar o crescimento desmesurado dum arbusto, próximo duma das janelas da casa, satisfeito por, ao fim de dois dias, a vacina que levara contra o Covid não apresentava quaisquer reacções adversas. Desbastava aqui, podava ali, sempre com preocupação geométrica, quando, de repente, se me insinua um ninho de melro. Deslumbrei-me, primeiro, com a delicadeza dos ovos, mas horrorizei-me, depois, qual sensação de crime cometido. É que, ao podar os ramos que protegiam o ninho, provavelmente ele irá ser rejeitado pelo casal de melros, sujeito que ficou à investida de qualquer predador. Preocupado, tentei camuflar aquele centro de vida com dois pequenos ramos, mas dificilmente isso resultará. A não ser que...
Vou ficar atento, vou acreditar. Talvez, quem sabe, os melros me surpreendam, como tantas vezes a Natureza o faz. Mas, até lá, fica uma sensação de culpa que teima em não desaparecer.
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