sábado, 26 de abril de 2014

PELE

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Margarida Cepêda, Entrada no Labirinto
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A tua pele é única, segredo alquímico forjado na tentativa de compreensão dos segredos mais simples e profundos.
Sabe das virtudes do ninho, mas respira ao ritmo dos voos em liberdade, em que a linha do horizonte é reformulação permanente.
Sente o apelo do longe, mas o amor que destila carece de se envolver no percurso, de sentir a saliva que hidrata as sensações.
Afasta o ruído das palmas fáceis, pois sabe que a recompensa é matéria delicada.
E as flores vão despertando...
A tua pele não é de ninguém, a tua pele é do mundo.
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Fevereiro de 2011
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sábado, 19 de abril de 2014

VARIAÇÕES COM CAROÇOS DE LARANJA

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Pintura de Kazuo Wakabayashi
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Para lá do templo, onde tudo se vende, no vale se cultiva, no mar se afere, na montanha se infere. 
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sábado, 12 de abril de 2014

ETEREAMENTE

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Enquanto subia foi afastando as urtigas, comichão impertinente, e sentou-se no alto da colina, resguardado de efémeros brilhos. 
Aconchegou-se nas estrelas, dimensão maior de todas as pegadas. O tronco do pinheiro onde se recostara era o elo de ligação ao lugar, base inglória de dados ao desvario. Esboçou a montagem do puzzle, ébrio na multiplicação de rotas sem fim, apenas respirava a intuição. Quase sem se dar conta - eterno navegante em busca de porto de abrigo - começou a procurá-la na imensidão, a dar guarida às memórias...
O apelo das estrelas redimensiona o olhar, dá-lhe lustro, mas é no pó que tudo começa, que tudo se forja. Quando voltar a subir a colina, em noite estrelada, as mãos estarão sujas de moldar o barro.
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sábado, 5 de abril de 2014

A LINGUAGEM DO SILÊNCIO

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Fotografia de AC
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Sentavas-te na varanda, à tardinha, mesmo em frente ao laranjal. Pouco falavas, era o silêncio que te conduzia, embalada na cantilena da água a cair no fundo do quintal.
Maio estava em pleno, o odor perfumado das flores insinuava todas as possibilidades. Os pássaros, em pleno festim de vida, pareciam falar contigo, vinham comer à tua beira. Não resistias, esboçavas duas ou três palavras, os pássaros voavam para longe.
Hoje, quando te inundas de mar, ainda procuras as palavras certas, a tela perfeita que te preencha a alma. Mas, sabes agora, algo ficou para trás, perdido no som ritmado daquela fonte, quando os pássaros pareciam falar contigo. As tuas palavras não tinham asas, ainda não entendias a linguagem do silêncio.
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