domingo, 11 de novembro de 2018

CRÓNICA TRANQUILA DE TARDE DE DOMINGO

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Fotografia de AC
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Na envolvência da casa, ladeada de árvores e arbustos, o festival de cor, à medida que os dias passam, tende a escurecer a riqueza de tons. É um fim de ciclo mas, em simultâneo, como que lembrando que os compartimentos da vida nunca são estanques, tudo se começa a preparar, sem pressas, para o fermentar dum novo desabrochar de vida, a eclodir daqui a alguns meses, quando o sol, magnânimo, se dispuser a voar mais alto, qual braço de ferro com a sombra em que ora agora mando eu, ora depois vences tu.
Chove lá fora, em abundância, numa melodia cerzida em tons fortes. A lareira, entretanto, já crepita, convidando ao recolhimento e à reflexão. Entra em cena um livro, uma música tranquila já se faz ouvir. Depois, lá mais para o fim da tarde, será a vez das castanhas sentirem o aconchego do lume. A jeropiga, para adoçar o prazer, já se encontra a postos.
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domingo, 4 de novembro de 2018

CONFESSIONÁRIO DO TEMPO

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Fotografia de AC
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Bates-me à porta, sem pedir licença, como se tudo estivesse acordado desde os primórdios. 
Vens bordar o apogeu das coisas, recordar que a beleza, para lá da interioridade, é definitivamente efémera. Concedes umas pausas, dizes tu, como que a alertar que a eternidade poderá existir num só olhar, desde que focado na essência das coisas. Esqueces, no entanto, que muita gente já nem sequer olha, apenas tenta sobreviver.
Teimas em bater-me à porta sem pedir licença, serás sempre bem-vindo. Mas, tempo, sabes, às vezes apetece-me escorraçar-te como se do pior vilão se tratasse. Bem sei que a culpa da cegueira que por aí grassa não é tua. Nós, humanos, eternamente rendidos à tentação do poder, é que temos a tendência, para não encarar as coisas de frente, a entregar as rédeas ao destino. Talvez seja defeito de fabrico, talvez seja medo da clareza e da lucidez, talvez seja apenas um ciclo, confesso que não sei. Sinto é que a ignorância e o medo tendem a caminhar, cada vez mais, de mãos dadas, abrindo caminho ao evento de monstros redentores.
Desculpa o desabafo, bem sei que a culpa não morreu solteira. Agora, já mais calmo, e se me permites, preciso respirar: vou tentar prosseguir o exercício de interiorizar a beleza, de forma natural,  que emana das pequenas coisas.
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