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A terra estava macia, fácil de revolver, piscando o olho à empreitada. O aprendiz, iludido pela aparente facilidade, foi cavando, cavando, enquanto enterrava as folhas, já desbotadas, caídas das muitas árvores que por ali havia. O último resquício outonal cumpria o seu ciclo no revigoramento da terra para próximas sementeiras.
Ao lado, a pedir atenção, as couves galegas continuavam pujantes. Uma ou outra lagarta, mais resistente ao frio, teimava em inquietá-las, mas já pouca mossa faziam. Eram as retardatárias, amantes de qualquer raio de sol, por mais breve, renegando a programada construção do casulo.
Os pardais, alheios ao esforço alheio, andavam por perto. Bicavam aqui, debicavam ali, pousando e levantando voo como se toda a terra fosse um imenso pardalporto. Duas das cerejeiras, ainda jovens, que serviam de poleiro a alguns deles, precisavam ser enxertadas, mas só para o fim do mês, talvez princípios do próximo.
A tarde avançava. Lá no alto, contrariando a lógica das estações, duas cegonhas planavam. O sol ameaçava esconder-se, com os últimos raios a serem ofuscados com a entrada em cena de algumas nuvens cinzentas, anunciadoras de chuva, provavelmente para amanhã.
O aprendiz, olhando para o castanho da terra, mira e remira o seu trabalho. Os olhos continuam a brilhar, perdidos naquela arquitectura tão simples, tão própria, quase como se fosse a primeira vez. Saciado, começa a colocar, alheio a pressas, a enxada e o ancinho no carrinho de mão e ruma, em tranquila cadência, para o abrigo das ferramentas.
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Vejo que os pardais seguem as mesmas regras em qualquer lugar deste planeta rsrsrsrsssss
ResponderEliminarÉ isso, Marta. Os pardais, ladinos como são, há muito perceberam que o ser humano é mais do género "muita parra e pouca uva". Daí sentirem-se à vontade em qualquer ambiente.
EliminarUm beijinho :)
Deu por terminado o seu belo trabalho!
ResponderEliminarUma parte do trabalho, Catarina. Nos próximos dias, se a chuva permitir, far-se-á a sementeira das favas, das ervilhas e dos alhos.
EliminarUm beijinho :)
Achei doce... Lindo texto!
ResponderEliminarObrigado, Ana.
EliminarUm Bom Ano! :)
Um belo texto. Um quadro extraordinariamente bem pintado. Li e reli.
ResponderEliminarUm abraço e um BOM ANO
Obrigado, Elvira.
EliminarUm Bom Ano também para si. :)
Há quem continue a labutar por dias melhores num acreditar que a colheita dos frutos seja melhor. Pior são as infindáveis "couves galegas com lagartas" que nos continuam a desviar a atenção num derrotismo sem precedentes.
ResponderEliminarDigo não e não e já nem lhes dou ouvidos e créditos, porque acredito sempre que "quem semeia injustiça colherá desgraças" e prefiro ter a atitude final, porque tenho sempre, desse "aprendiz"...
Gostei imenso porque escreves "p'ra caramba" 5*****
Um abraço
Fatyly,
EliminarA tua genuinidade está bem expressa na forma como comentas, uma qualidade que muito aprecio, mesmo que, por vezes, irrompas como um camião TIR. :)
As couves galegas, também por aqui apelidadas de couves negras, por apresentarem uma coloração verde escura e serem muito resistentes à geada, são ingrediente fundamental na confecção de caldo verde. São, portanto, umas resistentes. :)
Um beijinho :)
Fizeste-me sorrir AC pelo que te agradeço imenso, porque sou mesmo assim. Sou made-in-Angola e não tenho cura...é a todo o terreno. Se me chamam à atenção e vejo que tiveram razão, travo a fundo e peço desculpa!
EliminarGosto muito de caldo verde, mas apenas de couve portuguesa, a galega é indigesta pr'a burro:) e sfv não ponhas chouriço na minha gamela, desculpa tigela:)
Beijocas e agora vou fazer algo para comer!
Um texto narrativo e excelente como se o pudéssemos ver... As pausas são tão importantes e contêm tanta música...
ResponderEliminarUm beijo e BOM ANO:
Obrigado, Graça, pelo contributo do seu olhar/sentir depurador do supérfluo...
EliminarUm beijinho :)
Diz-me muito esta linguagem/voz da terra!
ResponderEliminarTambém "brinco" muitas vezes às sementeiras e me surpreendo/vibro com a paisagem circundante.
Gostei
Obrigado
Deixarmo-nos envolver pela paisagem circundante é um exercício que cultivo sem qualquer vislumbre de exaustão. Há, nesse acto, tantos pormenores, tantos sinais que fazem a apologia das pequenas/grandes coisas...
EliminarUm beijinho :)
Que bonito, AC. Quanta "inveja" tenho desse modo de vida. Isso sim é qualidade de vida. Viver em plena comunhão com a terra e com o céu.
ResponderEliminarFica um beijo, e a reclamação pela falta da sua fotografia ilucidativa da paisagem que aqui pintou.
A hora era de comunhão, Sandra, as evidências ficaram para segundo ou terceiro plano. Pensar em fotografar era, ao fim e ao cabo, estragar o momento.
EliminarUm beijinho :)
Nas entrelinhas deste belo "Elogio das Pausas" eu vi um mundo de metáforas a descobrir!
ResponderEliminarTodos somos aprendizes, iludidos pela aparente facilidade de quem - ou aquilo - que nos pisca o olho e nos incita a dar início às árduas tarefas de sementeiras, cuja colheita poderá não ser a esperada. Andam tantos pardais a debicar, aqui e ali, as sementes que deitamos à terra!
Quer a minha leitura deste belo "Elogio" esteja certa ou errada, é a minha leitura...Não deixei, no entanto, de me sentir muitíssimo bem inserida, neste quadro laborioso e bucólico.
Parabéns, A.C.
Belíssimo Elogio à terra, ao descanso tranquilo após a tarefa cumprida e a todos aqueles que se consideram - por muito que saibam - eternos aprendizes!!
Um abraço, sempre a aprender! :)
Janita
Costuma-se dizer que um texto, quando chega ao leitor, se liberta das amarras de quem o escreve, ganhando a dimensão que o leitor lhe quiser dar.
EliminarPara lá do preâmbulo, sempre lhe digo que simpatizo com a leitura que a Janita fez. Creio que é por aí... :)
Obrigado e... um abraço! :)
"pardalporto" ! :-) Os pardais dão realmente uma beleza imensa, e quando a terra está macia de humidade, até apetece cavar e programar as sementeiras, embora o que o belo texto nos transmite é essa comunhão entre o sujeito, a terra, o céu, e todos os seres vivos.
ResponderEliminarLindo, AC!
xx
A Laura é de leituras perspicazes. :)
ResponderEliminarUm beijinho :)
Apesar de todos os contratempos ainda é preciso semear para poder colher. E ainda há quem o faça. E que os pardais continuem por perto.
ResponderEliminarBeijinho AC
Quase me apetecia cavar, eu que sou tão pouco dada a essas lides. Chegou-me aqui o cheiro da terra e o piar das aves. :)
ResponderEliminarOi, A. C....há tanta beleza a apreciar no cotidiano...basta ter olhos para ver e alma para sentir e a poesia cria o mágico nas folhas que caem , nos pássaros que compõe parte que lhes cabe na maravilha do existir, na delicadeza que envolve a paz do simplesmente
ResponderEliminarsentir o correr das horas e do tempo
Um abraço
Não fora a coelhada a minha horta estava linda
ResponderEliminarassim delicio-me no teu texto
A terra está preparada.
ResponderEliminarAgora é semear para depois colher.
Boa semana
Uma autêntico hino... à grandeza, autenticidade e riqueza da simplicidade... que só num meio rural, se consegue usufruir verdadeiramente...
ResponderEliminarMuitas grandes colheitas... em talento e inspiração... desejo eu por aqui, neste novo ano... como esta, que tive o prazer de vir apreciar...
Beijinho! Boa semana! Bom Ano!
Ana
Colorida pausa. Deu-me paz! Um bj e um Feliz 2016 querido amigo!
ResponderEliminarum bucolismo amável, sereno e apaziguador..
ResponderEliminarcomo se toda a terra fosse, não um "imenso pardalporto", mas aluivão para todas as safras!
um prazer ler-te, meu amigo. sempre...
abraço
E começa mais um ano, repetem-se os ciclos! Adorei esta pausa!
ResponderEliminarBeijinhos e feliz ano novo :)
O aprendiz sempre com o olhar mais superficial,
ResponderEliminarperde tanta beleza e aprendizado.
O sábio vive sem pressa todos os ciclos e
entende a pausa, como o processo de respirar a vida
de outro modo, todo movimento é tão belo na vida!...
Grata pela leitura, AC!!!
Beijo.
que delícia de texto, quase que se sente o cheiro da terra e o olhar satisfeito do aprendiz...
ResponderEliminargostei...
beijinho
:)
Um cenário tão belo e tão bem descrito que me senti na pele do sábio aprendiz.
ResponderEliminarDesejo-lhe um Ano Novo repleto de inspiração.
Um beijinho
Fê
E há tanta humanidade no trabalho do aprendiz!
ResponderEliminarUma delícia de texto :)
~~~
ResponderEliminarUm quadro bucólico desta época muito interessante!
O aprendiz, de olhos brilhantes, sabe que aquela
terra castanha será pródiga a recompensar o seu
esforço.
Nas pausas, vai admirando o cenário que o envolve...
Um elogio ao prazer especialíssimo, dum viver sadio
e tranquilo, em contato com a admirável natureza...
~~~ Beijinho amigo, AC. ~~~~~~~~
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Por vezes, fico absorto com a sua simplicidade. É verdade: a poesia está nas coisas simples.
ResponderEliminarO texto é extremamente singelo para dar-nos conta da comunhão que podemos ter com a terra; não é acidental que tenhamos um aprendiz nessa lavoura. Quanto ainda tem que aprender, mas o o quanto já revela.
Forte abraço, A. C.
Escreve de facto muito bem mesmo.
ResponderEliminarUm abraço
(...excesso de trabalho)
Gostei muito deste texto, quase vi o que estava escrito.
ResponderEliminarum beijinho
Gábi
Adoro a forma como escreve e a mensagem que passa, simples mas profunda.
ResponderEliminarBjs e um feliz ano 2016
Gostei muito, cenário soberbo.
ResponderEliminarBom fim de semana
Beijo
Uma bela descrição do campo e de um dos seus inúmeros trabalhos.
ResponderEliminarGostei imenso do texto, é magnífico.
Bom fim de semana.
Abraço.
Gostei muito da narrativa, AC. Sente-se o pulsar da natureza.
ResponderEliminarEm março há-de chegar o equinócio com um tempo mais quente. Então as sementes e as árvores desabrocharão perfumadas. Em revoadas constantes virá a passarada, que há-de fazer a maquia. Cuidado com as ervilhas! Mas se tivermos em conta a fortuna de os ver no labor da procriação temos que aceitar o negócio da natureza: 50% para nós, 50% para os bichinhos. É justo.
Abraço
Seremos sempre aprendizes perante tudo o que nos maravilha. Tão só porque cada momento é especial.
ResponderEliminarSempre um prazer ler-te, AC
Bjo
Eu gosto desses que contrariam as estações. Porque não o fazem por rebeldia, não estão em atitude de confronto. Simplesmente são! Libremente são!
ResponderEliminarPor aqui sente-se o aroma da terra, do orvalho e das primeiras chuvas outonais...!Obrigada por isso.
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