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Mondavam paulatinamente, como sempre fizeram, como sempre viram os mais velhos fazer. A pressa era inimiga da perfeição, diziam, o que interessava era fazer bem. O manajeiro é que não estava pelos ajustes, e não se cansava de instigar o rancho de mulheres, que se espraiva pelos campos, obedecendo ao ritmo pausado duma canção dolente, entoada a meia voz por algumas das mondadeiras.
Nas horas de maior calor circulava uma bilha de água, pretexto mais que suficiente para endireitar as costas. Curta pausa, por mais saborosa, pois não ia além dum suspiro de alívio. E voltava-se ao ritmo da canção dolente, como se a música, cadenciando os gestos, abafasse as palavras do manajeiro.
As ervas dos outros, sem amor, nunca são iguais às nossas.
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Parece uma cena atemporal. Um dia desses, ao fazer uma caminhada, passei por um lugar onde havia um grupo de pessoas trabalhando (em tarefa completamente diferente), uma puxava uma cançãozinha, as demais acompanhavam, num resmungo. O que é que muda?
ResponderEliminarGostei muito desse texto. Um abraço, tenha um ótimo final de semana.
A música sempre serviu para amenizar os trabalhos árduos. Dias inteiros levávamos, debruçadas sobre uma tina de água gelada, escova na mão para lavar o Bacalhau que iria secar para a rua quando o tempo o permitisse. Cada tina tinha 16 mulheres, 8 de cada lado cantando para não sentir as dores nas costas e as mãos geladas. E eram mais de cento e cinquenta mulheres cantando, umas mais afinadas que outras, mas todas irmanadas na mesma toada.
ResponderEliminarAbraço, saúde e bom fim de semana
Um trabalho cansativo e incessante. Talvez a canção fosse uma forma de libertação. Gostei muito da frase com a qual finalizou seu texto. Abraço.
ResponderEliminarQuem canta
ResponderEliminarseus males espanta
Na monda, como na ceifa
na capela alentejana
fica um documento de como era
https://www.alvalade.info/as-ceifas-e-outros-trabalhos-agricolas/
Escreveste de um modo que dói. Parece que se arrancam as flores do peito. Trabalho duro, canção dolente.
ResponderEliminarE o que a Elvira escreveu também deixa marcas.
A canção, de facto, liberta e une.
Teu texto é excelente.
Beijo, caro amigo AC.
A música sempre foi um balsamo para aliviar trabalhos tão duros. Não é por acaso que até nos trabalhos da construção civil há sempre quem cante e ou têm um pequeno rádio aos berros. Pela minha terra sempre apreciei a apanha do algodão e do café onde grupos de mulheres e homens entoavam os seus cânticos.
ResponderEliminarE sim "As ervas dos outros, sem amor, nunca são iguais às nossas."
Gosto muito de Ricardo Ribeiro.
Beijocas e um bom domingo para todos e um beijo especial ao pequenito:)
Uma linda exposição de um cotidiano de trabalho que nos remete
ResponderEliminara uma condição que extrapola o presente e faz o canto da alma
de um povo e por isso mesmo universal
Um abraço
Já vim aqui várias vezes e ainda não consegui dizer nada, nem irei dizer agora muita coisa.
ResponderEliminarApenas te digo:
Obrigada, AC!
Pelo texto, pela canção, por escreveres e sentires a escrita nesse teu jeito que tanto mexe com as nossas emoções. Obrigada!
Gostaria que ouvisses "Mondadeiras" na voz de Luís Trigacheiro. Um jovem alentejano de 23 anos de idade, que a cantou de olhos fechados, no The Voice Portugal. Algo sublime e único.
Foi por isso que só agora cá vim. Antes não conseguiria.
Um abraço.
Até a mim me doeram as costas só de imaginar as mondadeiras curvadas o dia inteiro... Há sedes que nenhum tempo sacia... Excelente! O Ricardo Ribeiro é um cantor que me agrada imenso.
ResponderEliminarUma boa semana com muita saúde.
Um beijo.
A musica serve de alívio para muitos trabalhos arduos, para nos abstrairmos de algo que não é assim tão bom. A musica associa-se ao prazer e a coisas boas. Bjs AC
ResponderEliminarSinceramente AC, gostava de saber porque o seu blogue me aparece na listas dos blogues com esta indicação
ResponderEliminarInterioridades
Pensamentos de uma gaja:
Dia 151 -
Repensar o Natal??
Abraço e saúde
A situação é simples, Elvira. Durante alguns dias (poucos) o blogue Pensamentos de uma Gaja ficou sem acesso a comentários. Estranhei, mas como vi o símbolo do Blogger no fim de cada post, cliquei para ver o que acontecia. Abriu-se uma caixa e escrevi: "Repensar o Natal??" Não estava muito confiante com aquilo e, pelo sim, pelo não, resolvi clicar no “Publicar” para ver o que acontecia. Para meu espanto, o que escrevi apareceu no meu blog sob a forma de post, com as palavras indicadas pela Elvira. Apaguei-o imediatamente, mas parece que a pegada ficou. Paciência, não é grave. :)
EliminarObrigado por ter perguntado.
Um abraço
O texto relata uma dura realidade, mas o sacrifícios dessas e outros trabalhadores é que nos permitiu chegar até aqui.
ResponderEliminarAbraço solidário.
Juvenal Nunes
Sem amor não existirá vida.
ResponderEliminarBeijo
Música e palavras num diálogo mais que perfeito, AC!...
ResponderEliminarAproveitando para deixar a sugestão de um grupo musical... os Monda, que têm uma sonoridade perfeita também... para acompanhar os trabalhos da terra...
Ricardo Ribeiro, simplesmente uma das minha vozes de eleição da actualidade!...
Beijinhos, AC! Continuação de uma excelente e inspirada semana!
Ana
Excelente retrato
ResponderEliminarNa vida há quem se dobre
mas não parte
Abraço
Bom dia AC. Tens um título de um post novo e que não está visível será do meu pc ou não publicaste mesmo?
ResponderEliminarBom fim de semana e até segunda-feira pois estarei ausente.
Beijos
Fatyly, remeto-te para a resposta que dei à Elvira. :)
EliminarUm abraço
Ok já li e obrigado.
EliminarBeijos e bom fim de semana