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A nave tinha acabado de partir. O comandante, cumprindo o acordado, orbitou o decrépito planeta fumegante, onde as chuvas ácidas e as elevadas temperaturas se tinham tornado um hábito. Durante muito tempo, alguma opinião pública bem tentou pressionar os políticos no sentido de se enveredar por outro caminho, mas a ganância fora mais forte, e tinha-se chegado a um beco sem saída. Já pouco havia a fazer por aquela carcaça malcheirosa, com população a mais e os recursos praticamente esgotados, e onde o saudoso verde apenas podia ser observado nos registos de outrora.
Era ele pouco mais que menino de colo e já se lembrava de ouvir o pai, ao serão, a falar da necessidade de se encontrar uma solução para a Terra. Nessa altura os problemas já eram tantos, que a única saída para o homem era recomeçar tudo num qualquer outro ponto do universo. A vida, dizia ele, é o resultado dum número sem fim de recomeços, e este seria apenas mais um. Mas isso era com as futuras gerações.
Fora devido a essa visão que o pai tudo fizera para que ele se especializasse em biologia, mineralogia espacial, física, química... A ida para o espaço era a grande esperança de sobrevivência de toda a humanidade e, quando o Conselho aprovou o plano de saída, tinha sido dos primeiros a ser escolhido. E agora ali ia ele em direcção a Utopia, um planeta com as mesmas características da Terra, descoberto noutra galáxia, e que tinha sido profundamente estudado. Fazia parte de uma equipa que ultrapassara rigorosíssimas provas para testar a sua capacidade, e a sua tarefa era dotar o planeta das condições mínimas para receber os primeiros colonos da Terra.
A órbita já tinha sido completada, e a nave rumava agora para o futuro. Para trás ficava um planeta desesperado, cheio de problemas de toda a espécie, mas esperançado numa nova oportunidade. Que seria apenas para alguns.
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Era ele pouco mais que menino de colo e já se lembrava de ouvir o pai, ao serão, a falar da necessidade de se encontrar uma solução para a Terra. Nessa altura os problemas já eram tantos, que a única saída para o homem era recomeçar tudo num qualquer outro ponto do universo. A vida, dizia ele, é o resultado dum número sem fim de recomeços, e este seria apenas mais um. Mas isso era com as futuras gerações.
Fora devido a essa visão que o pai tudo fizera para que ele se especializasse em biologia, mineralogia espacial, física, química... A ida para o espaço era a grande esperança de sobrevivência de toda a humanidade e, quando o Conselho aprovou o plano de saída, tinha sido dos primeiros a ser escolhido. E agora ali ia ele em direcção a Utopia, um planeta com as mesmas características da Terra, descoberto noutra galáxia, e que tinha sido profundamente estudado. Fazia parte de uma equipa que ultrapassara rigorosíssimas provas para testar a sua capacidade, e a sua tarefa era dotar o planeta das condições mínimas para receber os primeiros colonos da Terra.
A órbita já tinha sido completada, e a nave rumava agora para o futuro. Para trás ficava um planeta desesperado, cheio de problemas de toda a espécie, mas esperançado numa nova oportunidade. Que seria apenas para alguns.
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Permita-me felicitá-lo pelo seu blogue e comentar os seus dois últimos textos, tão pertinentes na actualidade, cometendo um pequeno abuso e trazendo um poema de um poeta alemão que não foi traduzido para a língua máter.
ResponderEliminarThe Vanity of This World
Look anywhere you will, the Earth is empty show.
What someone builds today, another soon tears down;
Where now a city stands will be a grassy mound,
A place that only shepherds grazing their flocks will know.
What blooms so fair at daybreak, by noon is trampled low;
What bravely struts and strives soon turns to ash and bone;
No substance lasts forever, no brass, no polished stone.
One moment fortune smiles, the next brings bitter woe.
Tales of our mighty deeds like dreams must fade away.
How then should Man—Time's plaything—ever hope to stay?
Oh think, what are those objects we prize beyond compare?
Mere shadows, dust, and wind—all worthless, false and vain;
Field flowers glimpsed in passing and never seen again!
For that which is immortal, no man seems to care.
Andreas Gryphius
O egoísmo é primitivo, mas previsível. Sacrificar o bem individual em nome do colectivo é uma mostra de grandeza que o ser humano não está disposto a assumir.
ResponderEliminarRespondemos todos por esta culpa. E, curiosamente, pouco nos pesa na consciência.
O conhecimento é um trilho solitário e doloroso, é verdade. Mas a Lucidez não é, verdadeiramente, uma opção, ela impõe-se-nos tantas e tantas vezes...
ResponderEliminar#Anónimo,
ResponderEliminarObrigado pelas palavras e pelo contributo. Vamos lá a ver se consigo fazer a tradução com alguma eficácia, mas é sempre complicado traduzir poesia. Pode ser que algum leitor aceite o repto. :)
E.A.,
ResponderEliminarPalavras acertadas, as suas.
Quanto à questão da lucidez e do conhecimento, a primeira só existe se for alimentada pelo segundo, embora aqui os contextos não estejam perfeitamente definidos.
"Mas a Lucidez não é, verdadeiramente, uma opção, ela impõe-se-nos tantas e tantas vezes..."
Vejo, nestas palavras, a escolha de um caminho. Ainda bem.
Tchi, esta tocou-me fundo. Mas pelo rumo que as coisas levam, não me admiro nada que cheguem a este ponto. Vamos lá a ver se não será já demasiado tarde. Eu acredito que os chefões vão ter juízo.
ResponderEliminarAbraço
Continuo assidua leitora do seu blogue e dos seus textos, poemas, mas confesso que um dia destes lhe peço ajuda:)
ResponderEliminarJorge,
ResponderEliminarÉ claro que a Terra tem futuro. Mas os sinais de que se está a ir longe de mais na forma como a desrespeitamos são mais que muitos. Há que arrepiar caminho, e aí a opinião pública tem uma palavra a dizer, caso contrário as futuras gerações vão ter uma herança indesejável.
Ana, o que não se almeja hoje alcança-se amanhã.
ResponderEliminarConto consigo.
Bela maneira de alertar para os perigos que ameaçam o planeta e os movimentos ecologistas são sempre poucos para preservar a mãe terra, nosso aconchego ameaçado.
ResponderEliminarGosto da escolha que tomou, optando por pequenas narrativas que contêm significados profundos.E o seu planeta ou nave utópicos, se calhar, vão ser necessários.
Mais uma vez um texto de plena actualidadde e pertinência. É preciso alertar a malta, como diz a canção. Mas também é preciso acreditar como refere o Fado de Coimbra.Este blogue e os respectivos contributos dos leitores são pérolas lançadas ao vento que, aqui e ali, por este ou aquele, vão ser recolhidas e guardadas no Baú do Conhecimento e da Sabedoria, que as deixará saltar, no tempo e lugar certos, para ajudar a Esperança a crescer e florescer na acção de mudança. E isto vai alertar toda a gente. Vai consciencializar alguns (poucos)e envidar esforços para que a utopia se ultrapasse a si própria e se torne realidade.
ResponderEliminarVamos ver, sem compromisso, se tenho um bocadinho que me permita colaborar na tradução que se aproxime da ideia inicial do poeta.
De qualquer modo nunca, sob pretexto algum, se pode perder a Esperança.
Um abraço
Caldeira
Ibel e Caldeira,
ResponderEliminarÀ laia de contributo, deixo aqui o MANIFESTO DA TERRA-MÃE, uma carta do chefe índio SEATTLE, escrita em 1854, em resposta a uma proposta do Presidente dos Estados Unidos para comprar as suas terras. É extensa mas vale a pena ler. Quanta sabedoria!
"Como podeis comprar ou vender o céu, o calor da terra? A ideia não tem sentido para nós.
Se não somos donos da frescura do ar ou o brilho das águas, como podeis querer comprá-los? Qualquer parte desta terra é sagrada para meu povo. Qualquer folha de pinheiro, cada grão de areia nas praias, a neblina nos bosques sombrios, cada monte e até o zumbido do insecto, tudo é sagrado na memória e no passado do meu povo. A seiva que percorre o interior das árvores leva em si as memórias do homem vermelho.
Os mortos do homem branco esquecem a terra onde nasceram, quando empreendem as suas viagens entre as estrelas; ao contrário os nossos mortos jamais esquecem esta terra maravilhosa, pois ela é a mãe do homem vermelho.
Somos parte da terra e ela é parte de nós.
As flores perfumadas são nossas irmãs, os veados, os cavalos a majestosa águia, todos nossos irmãos. Os picos rochosos, a fragrância dos bosques, o calor do
corpo do cavalo e do homem, todos pertencem à mesma família.
Assim, quando o grande chefe em Washington envia a mensagem manifestando o desejo de comprar as nossas terras, está a pedir demasiado de nós. O grande
Chefe manda dizer ainda que nos reservará um sítio onde possamos viver
confortavelmente uns com os outros. Ele será então nosso pai e nós seremos seus filhos. Se assim é, vamos considerar a sua proposta sobre a compra de nossa terra. Isto não é fácil, já que esta terra é sagrada para nós.
A límpida água que corre nos ribeiros e nos rios não é apenas água, mas o sangue de nossos antepassados. Se lhes vendermos a terra, recordar-se-á e lembrará aos vossos filhos que ela é sagrada, e que cada reflexo nas claras águas evoca eventos e fases da vida do meu povo. O murmúrio das águas é a voz do pai do meu pai.
Os rios são nossos irmãos, e saciam a nossa sede. Levam as nossas canoas e
alimentam os nossos filhos. Se lhes vendermos a terra, deveis lembrar e ensinar aos vossos filhos que os rios são nossos irmãos, e também o são deles, e deveis a partir de então dispensar aos rios o mesmo tratamento e afecto que dispensais a um irmão.
Nós sabemos que o homem branco não entende o nosso modo de ser. Ele não sabe distinguir um pedaço de terra de outro qualquer, pois é um estranho que vem de noite e rouba da terra tudo de que precisa. A terra não é sua irmã, mas sua inimiga, depois de vencida e conquistada, ele vai embora, à procura de outro lugar. Deixa atrás de si a sepultura de seus pais e não se importa. A cova de seus pais é a herança de seus filhos, ele os esquece. Trata a sua mãe, a terra, e seu irmão, o céu, como coisas que se compram, como se fossem peles de carneiro ou brilhantes contas sem valor. O seu apetite vai exaurir a terra,
deixando atrás de si só desertos. E isso eu não compreendo.
O nosso modo de ser é completamente diferente do vosso. A visão de vossas
cidades faz doer os olhos do homem vermelho.
Talvez seja porque o homem vermelho é um selvagem e não compreende...
Nas cidades do homem branco não há um só lugar onde haja silêncio, paz. Um só lugar onde ouvir o desabrochar das folhas na primavera, o zunir das asas de um insecto. Talvez seja porque sou um selvagem e não possa compreender.
O vosso ruído insulta os nossos ouvidos. Que vida é essa onde o homem não pode ouvir o pio solitário da coruja ou o coaxar das rãs nas margens dos charcos e ribeiros ao cair da noite? O índio prefere o suave sussurrar do vento esfolando a superfície das águas do lago, ou a fragrância da brisa, purificada pela chuva do meio-dia e aromatizada pelo perfume dos pinhais.
O ar é inestimável para o homem vermelho, pois dele todos se alimentam. Os
animais, as árvores, o homem, todos respiram o mesmo ar. O homem branco parece não se importar com o ar que respira. Como um cadáver em decomposição, ele é insensível ao mau cheiro.
Manifesto da Terra-Mãe (continuação)
ResponderEliminarMas se vos vendermos nossa terra, deveis recordar que o ar é precioso para nós, que o ar insufla seu espírito em todas as coisas que dele vivem. O vento que deu aos nossos avós o primeiro sopro de vida é o mesmo que lhes recebe o último suspiro.
Se vendermos nossa terra a vós, deveis conservá-la à parte, como sagrada, como um lugar onde mesmo um homem branco possa ir saborear a brisa aromatizada pelas flores dos bosques.
Por tudo isto consideraremos a vossa proposta de comprar nossa terra.
Se nos decidirmos a aceitá-la, eu porei uma condição: O homem branco terá que tratar os animais desta terra como se fossem seus irmãos.
Sou um selvagem e não compreendo outro modo de vida. Tenho visto milhares de bisontes apodrecendo nas pradarias, mortos a tiro pelo homem branco de um comboio em andamento.
Sou um selvagem e não compreendo como o fumegante cavalo de ferro possa ser mais importante que o bisonte, que nós caçamos apenas para sobreviver.
Que será dos homens sem os animais? Se todos os animais desaparecem, o homem morrerá de solidão espiritual. Porque o que suceder aos animais afectará os homens. Tudo está ligado.
Deveis ensinar a vossos filhos que o solo que pisam são as cinzas de nossos avós.
Para que eles respeitem a terra, ensina-lhes que ela é rica pela vida dos
seres de todas as espécies. Ensinai aos vossos filhos o que nós ensinamos aos nossos: Que a terra é a nossa mãe. Quando o homem cospe sobre a terra, cospe sobre si mesmo. De uma coisa nós temos certeza: A terra não pertence ao homem branco; o homem branco é que pertence à terra. Disso nós temos a certeza. Todas as coisas estão relacionadas como o sangue que une uma família. Tudo está associado. O que fere a terra fere também aos filhos da terra.
O homem não tece a teia da vida: é antes um dos seus fios. O que quer que faça a essa teia, faz a si próprio.
Nem mesmo o homem branco, cujo Deus passeia e fala com ele como um amigo, não pode fugir a esse destino comum. Por fim talvez, e apesar de tudo, sejamos irmãos.
Uma coisa sabemos, e que talvez o homem branco venha a descobrir um dia: o nosso Deus é o mesmo Deus.
Hoje pensais que Ele é só vosso, tal como desejais possuir a terra, mas não
podeis. Ele é o Deus do homem e sua compaixão é igual tanto para o homem branco, quanto para o homem vermelho.
Esta terra tem um valor inestimável para Ele, e ofender a terra é insultar o seu
Criador. Também os brancos acabarão um dia talvez mais cedo do que todas as outras tribos. Contaminai os vossos rios e uma noite morrerão afogados nos
vossos resíduos.
Contudo, caminhareis para a vossa destruição, iluminados pela força do Deus que vos trouxe a esta terra e por algum desígnio especial vos deu o domínio sobre ela e sobre o homem vermelho. Este destino é um mistério para nós, pois não compreendemos como será no dia em que o último bisonte for dizimado, os cavalos selvagens domesticados, os secretos recantos das florestas invadidos pelo odor
do suor de muitos homens e a visão das brilhantes colinas bloqueada por fios
falantes. Onde está o matagal? Desapareceu. Onde está a águia? Desapareceu.
Termina a vida começa a sobrevivência."
Já conhecia e está disponível num opúsculo chamado "papalagui", mas a Sabedoria que encerra está sempre actual.
ResponderEliminarCaldeira
Obrigada, Agostinho.Não conhecia e fiquei enriquecida.
ResponderEliminarQualquer planeta "com as mesmas características da Terra" será um planeta perigosamente condenado...
ResponderEliminar... se não houver mudança de atitude;
... se não se impuserem os valores da humanidade acima dos individuais...
...se não acreditarmos que a oportunidade é para todos…
É claro que ficar “acomodado” nas lamúrias e na desilusão é a perda da esperança, e nesse sentido, qualquer nave, qualquer outro "Utopia" representará o procurar de alternativas, de novos rumos pela sobrevivência.
Mesmo desejando o contrário, continua a prevalecer, de forma incontornável (?) a antevisão de que a oportunidade "seria apenas para alguns”...
Mesmo assim, há que lutar por uma herança desejável!
A imagem deixa muita esperança, pelo menos, no Interioridades!
JB,
ResponderEliminarA referência às mesmas características da Terra pretende ter apenas a ver com questões físicas e químicas: ar, água, clima...
Parte-se do princípio que quem usufruísse duma segunda oportunidade teria bem presente todos os erros cometidos. Ao fim e ao cabo, estavam em Utopia, não será? :)
Claro, e por estarem em Utopia achei que, logo à partida, o planeta perfeito ou ideal ou irreal deveria contemplar igualdade de oportunidades (o que na Terra não é possível! :)
ResponderEliminarOf course! :)
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