quarta-feira, 23 de setembro de 2020

POR TERRAS DA MAÚNÇA

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AC, Serra da Maúnça
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O convite surgira, apelativo, e não havia como dizer que não. E lá fomos em busca da Serra da Maúnça, prolongamento geológico da Serra da Gardunha.
A partida foi dada no santuário de Santa Luzia, no Castelejo, padroeira dos olhos, situado num promontório com uma bela vista envolvente. Mas o projecto, sedutor, iria exigir mais, muito mais. 
As primeiras centenas de metros foram tranquilas, com passagem por vacarias e pomares de variada índole, com predominância de cerejais, de plantação recente. Mas logo o caminho se começa a inclinar, como que a lembrar que as coisas gratas exigem sempre um esforço suplementar.
Passámos por matagais, com predominância de urzes e giestas, que rejuvenesceram a zona, substituindo o pinheiro, após dramáticos e inquietantes incêndios. Mas, indiferente às cogitações dos visitantes, o caminho continua a inclinar. E a marcha torna-se mais lenta, enquanto as colmeias se tornam elemento habitual da paisagem, com um leve zunzunar como música de fundo.
Mais um esforço, um gole de água vem mesmo a propósito, e começam a surgir medronheiros e alguns castanheiros, com mais colmeias de permeio. Por aqui cultiva-se mesmo o mel.
Chegamos, finalmente, ao topo. Um ou outro pinheiro, sobreviventes de incêndios e ventanias, a fazer companhia aos aerogeradores eólicos que povoam o alto das montanhas envolventes. Estacionamos junto dum afloramento granítico, autêntica ilha em mar xistoso, e deixamo-nos transportar na paisagem, disponível num ângulo completo, quase diria mais que giro. A distância, consagrada em diferentes horizontes, cada um com a sua particularidade, convida a um sorriso discreto, mas de ampla satisfação. Os deuses estavam mesmo generosos quando configuraram a altitude e a latitude daquela  montanha.  Quantas perguntas refugiadas na penumbra, como se tudo fosse perceptível! Ali, perante o impacto da grandiosidade da envolvência, a repor cada um no seu verdadeiro lugar, ninguém ostenta rótulos, ali apenas se sente. Profundamente. 
Refeita a alma, havia que cuidar do corpo. E os acepipes, saídos das diversas mochilas, cumpriram bem a sua função, dando azo a uma conversa despreocupada, bem condimentada de risos e sorrisos.
Bem refeitos de corpo e espírito, e com a conversa em dia, percorremos o que restava do cume e começámos a descer, serpenteando até à aldeia do Açor, onde, por entre sorrisos, aproveitámos para adquirir alguns produtos locais: mel, aguardente de medronho - de produção do ano anterior - queijo de cabra e algumas romãs. Ainda houve quem invocasse as castanhas, mas essas ainda precisavam de mais um tempo de maturação. 
Um adeus, mais sorrisos, e a descida continua até à Enxabarda, terra de confirmada resistência às históricas invasões francesas, onde nos aguarda o transporte que nos levará de volta ao Fundão, de alma cheia e de bem com o mundo. Sem máscaras.
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20 comentários:

  1. Acredito que tenha sido um passeio maravilhoso
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    Abraço poético

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  2. AC

    Deve ter sido um passeio que lavou a alma e a vista.

    Beijinhos

    :)

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  3. Que bom que o convite foi aceito. Acho, ou melhor, tenho certeza, foi muito legal. Linda foto! abração,chica

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  4. Um belo passeio para revigorar o corpo e fortalecer a alma.
    Abraço e saúde

    Á margem: Estou sem computador que avariou e com o meu problema de olhos é muito difícil comentar, no Smartphone

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  5. Mais uma vez, não escreveu, pintou, com realismo e, levou-nos a todos nesse passeio. Muito obrigada :)

    Boa noite, sô AC

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  6. Que belíssima descrição de uma passeio pelas serrarias beirãs!
    Pareceu-me assistir a um filme narrado, onde cada pedaço de caminho é sentido por quem 'ouve' o narrador.

    Fiquei com água na boca quando chegaste ao queijo de cabra. Adoro!

    Obrigada por nos teres levado contigo...sem máscaras de falsidade, mas com a máscara protectora, no bolso...:)

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  7. Já pedalei muito pela serra do Açor que achei maravilhosa, mas quando li Maunça achei engraçado, aqui, na serra d'aire e Candeeiros também há uma Maunça bastante ingreme e. Dificil de subir. Compensa a chegadaa ao topo e a vista fantástica. Boa noite

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  8. Conheço muito mal a região.
    Aquele abraço

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  9. Uma trilha perfeita para o corpo e a alma.
    Um convite desses que preciso_ vegetação agreste ,muito verde , montanhas e muita paz. E um cansaço que revigora.
    Deu inveja AC
    deixo abraço

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  10. Que maravilha uma excursão assim, e ainda sem máscaras... É muita felicidade.

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  11. Muito obrigado pelo belo passeio turístico que ora me proporcionaste.

    Abraços,

    Furtado

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  12. Gostei muito do passeio. Com um guia tão experiente e apaixonado pela natureza, fico com vontade de conhecer. E do Fundão tenho boa experiência gastronómica.
    Beijinhos, AC. :)

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  13. Oi, A.C. que belo passeio e muito bem descrito...acompanhei de perto e sentia as mesmas alegrias. Ninguém resiste a uma bela paisagem.

    Um abraço

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  14. Após ler seu poético texto, não pude deixar de refletir sobre a colocação: "coisas gratas exigem sempre um esforço complementar". Tudo é tão magnífico em um passeio desses que o cansaço não pesa na mochila. E a leveza da alma se mostra ao fim dele. Gostei demais! Abraço.

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  15. Obrigado Sô Guia por esta excursão que gostei imenso. Fiquei cansada mas muito bem disposta.

    As tuas fotos são excelentes e esta está uma pérola.

    Beijocas e um bom fim de semana

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  16. Passeios assim são necessários para alimentar a alma e refrescar a cabeça!
    Um beijo

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  17. Invejável passeio!... Digo eu daqui... mascarada quase até à hipóxia, no meio da toxicidade labiríntica e citadina... esquivando-me de viroses e neuroses!... :-))
    Beijinhos
    Ana

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  18. Vim avisar que acaba de entrar céu teu lá! Podes ver aqu8i:

    http://ceuepalavras.blogspot.com/2020/10/blog-post_25.html

    Obrigadão! abrs, chica

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