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AC, Árvore dos pequenos milagres
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As manhãs têm acordado tingidas de branco, com a geada a tricotar complexas geometrias a que poucos dão atenção, tolhidos pelo frio. Mas o sol logo se levanta, dominador, avesso a alvas arquitecturas. Aos poucos a passarada começa a fazer-se notar, ensaiando os primeiros gorjeios duma eterna sinfonia.
Começa a desenhar-se o ritmo cadenciado da enxada, insaciável na vontade de cavar fundo. Surge uma cova, duas, cinco, oito..., a quem sopro palavras cerimoniosas que mais ninguém ouve. Irão ser portal de entrada para novos seres, ávidos de estreitar laços com a grande mãe, e toda a harmonia é necessária. É então que entram em cena as árvores em fase imberbe: amendoeiras, nogueiras, marmeleiros, macieiras e limoeiros, todas ávidas de entrar em sintonia com a filosofia da Grande Arquitectura.
A tarefa, bem condimentada de estrume, vai-se cumprindo num aparente alheamento do tempo, imune a qualquer bramido do mundo dos homens. As pausas surgem, com naturalidade, com a vista, em estreito contacto com a alma, a alternar poiso entre o arvoredo da Gardunha e a grandeza granítica da Estrela. Lá no alto, sem pressas, uma ou outra ave de rapina vai planando, à espera dum qualquer sinal.
A luz começa a esvair-se, o corpo começa a pedir aconchego. Mas, antes, um eterno assomo alquímico, em que os deuses parecem mostrar uma ínfima ponta do véu, ainda que por breves instantes, de algo que nos transcende: o Sol, num último gesto acariciador, parece vestir-se dum enorme manto mágico que tinge o céu, estendendo a passadeira à Lua com um enorme piscar de olho. É a hora dos pequenos milagres.
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Não sendo a audição o meu sentido mais apurado, ia jurar ter ouvido algumas dessas palavras, quase místicas, que sopraste a esses novos seres que, hoje, entraram, pela tua mão e esforço, no seio da Mãe Natura que tudo gera e cria.
ResponderEliminarTão bom ler, e ver, com os olhos da alma, a vida, de forma linda e poética como só tu sabes descrever...
Um beijinho, AC. :)
Renascer, toda a poesia num só verbo.
ResponderEliminarPassar por cá, faz bem.
Lídia
Magia aliada à beleza foi o que senti aqui. LINDO! abração,chica
ResponderEliminarSe o Sol é meu amigo
ResponderEliminarnão admira
que ele esteja assim contigo
Parece que era eu que estava lá a ver toda aquela luz, toda aquela paisagem fantástica. Um abraço AC
ResponderEliminarGosto, gosto muito de ler quem pinta escrevendo. O senhor é um desses.
ResponderEliminarÉ bom, e gosto, de senti-lo por cá.
Boa noite :)
Como gostava de ter uma árvore assim para mim ;)
ResponderEliminarMuito bonita esta partilha, AC.
Beijinho e votos de Bom Ano.
A imagem já transmitia tranquilidade.
ResponderEliminarQue o texto confirma e acentua.
Aquele abraço
Depois dessa zorra toda, com mísseis cruzando os céus, como presente de Natal, 'Chefes de Estado' colocando a estabilidade mundial em pânico, é bom demais ler um texto poético, exaltando a natureza! Uma pausa para não enlouquecermos.
ResponderEliminarMuito lindo.
beijinho.
Invejo essa bem-aventurança de cultivar e ver crescer o que se plantou. Já não tenho tempo como gostaria para isso.
ResponderEliminarUm grande abraço!
A hora dos mágicos cansaços de que falava Florbela. Aqui com uma árvore em primeiro plano para celebrar a paisagem. Um texto maravilhoso.
ResponderEliminarUm beijo.
O poeta encontra sempre a beleza da natureza no mais profundo do seu ser e constrói com palavras a joia do pequeno milagre.Parabéns!
ResponderEliminarUm abraço
A desenhar palavras de corpo inteiro
ResponderEliminaraqui para os amanhãs se continua a plantar árvores
para encanto dos que lêem
Abraço
Poeta , é muita beleza junta !
ResponderEliminarQue seu novo ano seja tão bonito e delicado como este texto que chega a emocionar .
Obrigada pela generosa partilha .
Beijos
A tua paisagem e a vida que dela se extrai provoca prazer bucólico e estético.
ResponderEliminarBeijos.
Tenho algumas arvores de fruto aqui na nova casa.
ResponderEliminaralgumas plantadas pelos miudos.
Mas confesso que não lhes dou muita atenção... (Sacrilégio - dirá o AC!)
Mas estou a tentar cultivar as minhas malaguetas, estou com 22 pés bem pegados, e a fazer tudo para que vinguem! Hei-de fazer uma divisão de canteiros com arbusto de malagueta.
E depois...
E deixar-me encantar pelas cores com que o sol pinta o céu - dessas nunca me canso!
Que este novo ano seja uma porta aberta para novos sonhos, renovações de fé e muita paz para nós e para o mundo. Feliz 2020!💋
ResponderEliminarQue os pequenos milagres continuem a te inspirar a escrever cada vez mais para podermos te ler no seu melhor. Um abraço AC.
ResponderEliminarAo ler-te embalada pela melodia de cada momento fiquei com uma paz interior que nem imaginas. Não consigo dizer mais nada.
ResponderEliminarBeijos e um bom dia
Um pequeno milagre é o sentimento harmonioso que nos enche o peito com a leitura deste texto.
ResponderEliminarAbraço e bom fim de semana
R: Os meus olhos não melhoram sem o transplante que espero desde Setembro.
É um prazer saborear os seus textos, AC.
ResponderEliminarTransbordam uma poesia telúrica matizada de cores e saberes bucólicos -- que sempre me sensibilizam -- expressos numa correcção que muito honra a Língua Portuguesa.
Também aprecio e emociono-me com a «hora dos pequenos milagres.»
Beijinho
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"É a hora dos pequenos milagres" que a mão fecunda de AC opera nestes textos primordiais.
ResponderEliminarUm ciclo completo da aurora ao crepúsculo poente que se fez e faz na/para harmonia das coisas realmente belas. Realmente essenciais. E que mais é preciso? Nada.
Abraço amigo ao Amigo (des)conhecido que retemperou o aço de que é feito e voltou. Muito me alegra este regresso. Um bom sinal para ano do par de cisnes com bóia, à cautela. Tudo de bom.
Que bonito!
ResponderEliminarE que pode haver de melhor que a comunhão com a natureza?
Adorei ler!
beijinho
Um texto adorável... que nos faz sentir mesmo por lá... respirando os ares do campo... e também assistindo, a tão especial momento!...
ResponderEliminarQue bom tê-lo de volta, AC... e ao encanto que as suas palavras sempre nos oferecem... sugerindo momentos tão especiais quanto este... desfrutando-se as maravilhas da natureza...
Beijinho! Feliz semana!
Ana
Meu caro Agostinho! Que saudades eu tenho de te encontrar, pessoalmente, e até por aqui. Não sei o que me deu que já passaram anos sem eu passar por esta sala de aula onde aprendo muitas coisas e me sinto feliz.
ResponderEliminarVoltei a este espaço, o teu e o meu, porque me deu vontade de deixar memórias, vivências. Verifique, com muito agrado, que também passaste pelo meu quintal. Devias ter entrado em casa porque a casa dos amigos estão sempre escancaradas.
Grande abraço meu amigo.
É muito bom lê-lo, escreve muito bem.
ResponderEliminarEu sinto esse apelo do campo...assim este texto, pleno de sensibilidade cativou-me.
ResponderEliminarBeijo