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Salvador Dali, A Persistência da Memória
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A canícula tem sido inclemente, tolhendo gestos e pensamentos, configurando um galinheiro em estado de sítio, com as galinhas a perderem o norte. Mas eis que, repentinamente, os deuses se compadecem, e enviam uma chuva apaziguadora, entremeada de raios e trovões, qual recado para os pretensos donos dum qualquer galinheiro.
A vida quer-se simples, apregoa o filósofo da reconciliação, mas isso dá uma trabalheira danada. E, pondo de lado qualquer reflexão, condição mínima para qualquer tentativa de evolução, dá-se primazia ao grito, à vitimização, tentando condensar a razão de ser aos gestos mais básicos e mais boçais. Dizem-me que é assim, que é da natureza humana, mas tenho dificuldade em aceitar essa argumentação. É que, para lá do básico, há sempre uma margem de progressão, alicerçada em princípios nobres e elevados, assim nós o queiramos. É uma luta dura, eu sei, uma luta de sempre. Com avanços e recuos. E não é à toa que, no mundo em que vivemos, emergem, ciclicamente, figuras de banda desenhada, ou de qualquer má ficção, como Trump, Putin, Bolsonaro, Kim Jong-un...
Voltemos à chuva benfazeja, permitam que me centre na minha horta. Ela sofreu, há tempos, um forte revés, mas, a pouco e pouco, começou a renascer, produzindo tomates, curgetes, pepinos, alfaces, cebolas, pimentos... Como em tudo, há que dar tempo ao tempo. E o gozo que me dá, depois da rega, colher esta ou aquela espécie para abastecer a cozinha!
Infelizmente, vivemos num tempo em que todos parecem querer tudo para hoje, olvidando as memórias, individuais e colectivas, de como se chegou até aqui. E exigimos, exigimos cada vez mais, como se tudo viesse dum saco sem fundo.
Agradeço aos deuses a chuva retemperadora, propícia a uma pequena pausa, mas ela não esbate a evidência: olhar para o nosso ego, continuamente, sem nos preocuparmos com a visão e o bem-estar dos outros, vai acabar por dar cabo de nós, sejamos bons ou maus. Sem excepção.
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Voltemos à chuva benfazeja, permitam que me centre na minha horta. Ela sofreu, há tempos, um forte revés, mas, a pouco e pouco, começou a renascer, produzindo tomates, curgetes, pepinos, alfaces, cebolas, pimentos... Como em tudo, há que dar tempo ao tempo. E o gozo que me dá, depois da rega, colher esta ou aquela espécie para abastecer a cozinha!
Infelizmente, vivemos num tempo em que todos parecem querer tudo para hoje, olvidando as memórias, individuais e colectivas, de como se chegou até aqui. E exigimos, exigimos cada vez mais, como se tudo viesse dum saco sem fundo.
Agradeço aos deuses a chuva retemperadora, propícia a uma pequena pausa, mas ela não esbate a evidência: olhar para o nosso ego, continuamente, sem nos preocuparmos com a visão e o bem-estar dos outros, vai acabar por dar cabo de nós, sejamos bons ou maus. Sem excepção.
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Se nos dedicamos a ver reflectida a nossa imagem, o umbigo, pode ser uma enorme cacimba onde nos podemos afogar.
ResponderEliminarBoa tarde, sô AC
Haha, tem toda razão: tornar a vida simples dá muito trabalho. Muito! Compensa? Não sei. Por aqui, o tomate em rama vai progredindo na horta. Vale o mesmo para o manjericão-roxo.
ResponderEliminarTenha um ótimo dia!
Prosa em imaginário e não só, poético. Gostei de ler.
ResponderEliminar.
Abraço
Cumprimentos poéticos
evolução...para onde, não sei!
ResponderEliminaragora, que os tempos estão difíceis, estão!
(mesmo p'ras hortas).
abraço
Tal e qual AC e os galinheiros cujos galináceos perdem o norte leva-me ao que sempre disse: Se há sol e calor os tomates secam e berram por subsídios se há chuva e vento os tomates apodrecem e berram por subsídios.
ResponderEliminarNa actual conjuntura do país é tudo a berrar por subsídios e muitos galináceos "fazem das suas" para meterem "mais ao bolso" sem pensarem que mesmo ao lado, ou mais adianta ou até atrás há pessoas que não têm nada para comer e sobretudo para dar aos filhos. De tal forma é ganância que há galináceos que vão às bancas catar milho quando têm o papo cheio.
Atravessamos um "Tempo" em que muitos obcecados pelo poder e ganância ficam "sem Tempo" para trabalharem o que o ser humano tem de melhor.
Tenho pena de não ter uma horta mas dou graças a Deus ao Manel das Couves, à Maria dos ovos e ao Zé das cebolas que volta e meia surpreendem-me com..."menina quer aproveitar?" ao não que não quero:))
Um abraço e vamos em frente a sorrir e sem lamechas!!!!
Entretanto a minha horta de floreira, vai evoluindo bem devagarinho mas, penso que, com o passo certo :-)
ResponderEliminarQue venham relâmpagos
ResponderEliminarem todas as estações
Quando “a natureza humana” é desculpa para justificar atos e ações, é porque, realmente, dá muito trabalho pensar numa evolução positiva para o bem de todos. Mas, mesmo assim, ainda acredito na bondade do ser humano. : ))
ResponderEliminarDecidimos ligar só aos tomates e pimentos. É o que se dá bem no meu quintal. Há uns dias uma forte granizada ia estragando tudo. As uvas não serão deliciosas e enormes como habitualmente.
ResponderEliminarMas a tua reflexão vai mais longe e não entendemos a crueldade e a injustiça. E nessas figuras de má ficção alguém votou. Como é possível?
Beijinhos, AC.
Pois, AC e Teresa, há quem votou e elegeu. É do que padecemos aqui, de uma figura de má ficção, que saiu do fundo baú.
ResponderEliminarDe qualquer modo, são lições e reflexões. Em paralelo. Talvez aprendamos um dia, ainda há tempo...
Abraços, meu caro AC
Chuvada que por aqui chegou e que estava a fazer muita falta.
ResponderEliminarAté se respira melhor!
Aquele abraço
O texto é fantástico, mas a tela é maravilhosa.
ResponderEliminarComo eu desejava que a empatia e o bom senso, se cultivassem numa horta... já que faltam tanto, pelo mundo... e particularmente a essas insanas figuras mencionadas, que mandam numa grande parte do mesmo... e o contaminam, com a sua frieza e inconsciência...
ResponderEliminarQue o tempo ajude, desta vez... e uma boa colheita, continue em franco progresso, por aí, AC!...
Beijinhos! Votos de uma excelente semana, e um óptimo Agosto!
Ana