.
AC, Margaridas
.
.
Para quem pode, e capricha na necessidade de sentir, os campos já exultam de margaridas. Nada de mais para quem tem como exercício resplandecer o olhar, mas a cada ano que passa, e por mais que a Natureza transmude, há sempre algo que se insinua, qualquer coisa de novo que transparece. E a alma regista e alimenta-se, naturalmente.
Caminho por entre as ervas, muitas delas engalanadas com o cartão de alforria, feitas flores, enquanto ouço a música de acasalamento da pardalada - já? que se passa? - em ária quase monocórdica que reflecte uma única intenção. Bem andam eles, pardais, seres de natural linguagem.
Apesar do céu cinzento, a ameaçar chuva após dois dias de manifestação do poder solar, não resisto em caminhar por entre as frutícolas. As macieiras, as pereiras, as figueiras, as nogueiras e os marmeleiros, mais as nogueiras e os castanheiros, parecem não querer despertar do sono a que têm direito, mas as cerejeiras já parecem querer dar sinal de si, invejosas do damasqueiro e das amendoeiras, já em plena floração. Um pouco ao lado, e pouco tempo após o parto, as oliveiras ainda estão em pousio. Dos limoeiros e da laranjeiras falo em tom mais baixo, já que continuam em estado de observação após a investida da geada. Mas, aqui para nós, e reivindicando uma cumplicidade imune a citrinos, se é que ela existe, vislumbro por ali poucas hipóteses de sobrevivência. A não ser, como muitas vezes o faz, a Natureza me surpreenda.
Regresso à minha moderna caverna, não sem antes dum vislumbre final. As alvas margaridas, com um ou outro maior assomo, aqui e ali, assumem-se como autêntico oceano, deixando ressalvar pequenas ilhas, de couves e ervilhas, que só salientam ainda mais o seu encanto. E, de alma cheia, aguardo pela chegada do Whisky, habitual visitante deste pequeno paraíso, um quase residente que vem partilhar alguns dias connosco. Quem não deve ficar satisfeito é o gato, candidato a domiciliado, que, durante a estadia do canídeo, não deve dar sinais de vida. Entretanto, e num afã próprio dos rituais familiares, sinónimo, no bom sentido, dos pequenos grandes prazeres, alguém chama por mim para dar início à degustação dum cozido a portuguesa, tradição de todos os carnavais. Com ou sem confinamento.
.
.
Nasci no campo algures no Ribatejo-Portugal. Emociono-me ao ver estas fotos de campos cobertos de flores, como eram (e são) aqueles campos onde nasci, corri, cresci. Fico, confesso, emocionado.
ResponderEliminar.
Saudação poética
.
Pensamentos e Devaneios Poéticos
.
Mas que grande pomar o teu! Árvores de fruto com abundância, que te garantem fartas colheitas e muito trabalhinho, nas podas e quejandos.
ResponderEliminarNada que canse o corpo e a alma de um Homem feliz... Que vida boa! :)
Beijinho, AC.
ResponderEliminarA natureza, felizmente, continua indiferente ao que se passa no mundo.
Ter o dom de saber observar essas vidas, sejam ou não margaridas, não é para todos AC.
Há tradições que se devem manter e, um cozido cai sempre bem (:
Beijinho
Sabe, sô AC, eu sou filha da cidade com a sorte maior de ter vivido durante alguns anos no campo, numa Vila lindíssima, e por isso, gostar tanto destes seus postais que conseguem trazer-me lembranças boas e até cheiros.
ResponderEliminarObrigada
Boa noite, belíssima foto com as flores e o campo. A natureza é um presente divino para nós. Além de nos dar também o seu doce perfume. Ela nos brinda com o que de melhor possui, flores. O silêncio, com o qual, a natureza nos premia é fabuloso.Temos os sons dadivosos da mata e seus inquilinos majestosos, sem o ruído urbano, que nos chateia. Excelente, boa noite!
ResponderEliminarSan Tai Kin Hong
ResponderEliminar(Votos típicos de Ano Novo Lunar e que significam boa saúde durante o ano).
Mais um post genuíno e como as coisas simples nos dão tanto alento e esperança. Claro não falo no imenso trabalho que deves ter com a "tua plantação" e os citrinos mandaram-me mensagem que em breve irão surpreender-te.
ResponderEliminarNo domingo numa ida ao supermercado dei a volta ao contrário para apreciar os campos e estão cobertos de flores e no meio delas as altivas papoilas encarnadas numa de "quem manda aqui somos nós". Olhava para o outro lado e vi o oceano bem bravo. Foi uma mera meia-hora de ar bem puro que me encheu a alma.
Tens que dar um nome ao gato...sugiro "escondido ou vadio":))))
Um cozido à portuguesa caí sempre bem, ó se cai!!!!
Beijos e uma boa tarde
Bem-aventurados os que vivem em plena Natureza, a sabem apreciar e descrever.
ResponderEliminarObrigada
Abraço
Os frutos poderão ficar-se pela promessa, mas garantida é a saborosa poesia que ofereces. Acompanho a passo a tua caminhada.
ResponderEliminarAbraço de grande amizade. :)
Belas margaridas. Aqui elas florescem em outra época. Os limoeiros, no entanto, estão no auge.
ResponderEliminarTenha um ótimo restante de semana!
Aqui tenho um cenário levemente parecido, da minha janela das traseiras... com todo o barulho de fundo de um meio urbanistico... o melhor e o pior de dois mundos...
ResponderEliminarBelíssimo o texto, com uma riqueza descritiva formidável...
Beijinho
Ana